quinta-feira, 12 de abril de 2012

Liquidificando e Peneirando - História Medieval







Resumão da apostila do Jacques Le Goff, sobre a instalação dos bárbaros no Ocidente Romano - transição da Antiguidade para o Medievalismo.


Até lá, povo da História!






LIQUIDIFICANDO E PENEIRANDO
A Instalação dos Bárbaros - Jacques Le Goff

por: Jorge Luiz da Silva Alves



=> (pág. 27) O Ocidente medieval nasceu sobre as ruínas do mundo romano. Nelas encontrou ao mesmo tempo, apoios e desvantagens. Roma foi seu alimento e foi a sua paralisia.

=> (pág. 28) A grande crise do século III minou o edifício. A unidade do mundo romano desfez-se e o seu coração – Roma e a Itália – deixou de irrigar os membros, que procuraram viver com vida própria: as províncias emanciparam-se e passaram a ser, por sua vez, conquistadoras. O ouro que paga as importações do luxo foge para o Leste, produtor e intermediário, cujos mercadores judeus e sírios monopolizam o grande comércio. As cidades do Ocidente entram em anemia e as do Oriente prosperam.

=> (pág. 29) O Cristianismo é um falso aliado de Roma. Os imperadores julgam conjurar o destino abandonando os deuses tutelares, que falharam, pelo Deus novo dos cristãos. A renovação constantiniana parece justificar todas as esperanças: a paz e a prosperidade parecem estar de volta sob a égide de Cristo. Mas, para a Igreja nascente, as estruturas romanas são, simplesmente, um quadro onde tomar forma, um alicerce onde se apoiar um instrumento para se afirmar.

=> (pág. 30-31) As causas das invasões importam-nos pouco. Os aspectos dessas invasões é que são mais importantes. Os invasores eram fugitivos pressionados por outros, mais fortes ou mais cruéis que eles. A sua crueldade era muitas vezes a do desespero, em especial quando Roma lhes recusavam o abrigo que eles, tantas vezes pacificamente lhes pediam. Se os Godos pegaram em armas contra os romanos em 378, foi porque tinham sido confinados em um território exíguo e sem recursos, onde os romanos tratavam-nos como animais, abusando deles como se escravos fossem, ou pior coisa.

=> (pág 36) Em sua caminhada desesperada pelo moribundo império, os bárbaros se beneficiaram da cumplicidade ativa ou passiva da massa da população romana. As camadas populares eram cada vez mais massacradas por uma minoria de ricos e poderosos, e isso explica o êxito das invasões bárbaras. Para não perecer à perseguição pública vão procurar entre os Bárbaros a humanidade negada pelos Romanos. E terminam por gostar muito mais de viver livres sob a aparência da escravidão bárbara do que escravos sob o fictício rótulo de cidadão romano.

=> (pág 38-39) Os Bárbaros que se instalaram no Império Romano no século V não eram mais os selvagens de trezentos anos antes; os caminhos percorridos tinham-nos levado a contactar com culturas e civilizações em que recolheram costumes, artes e técnicas. E outro fato de capitaol importância transformara a face dos invasores. Embora uma parte mantivesse-se pagã, a outra cristianizara-se. Mas por um curioso acaso que viria a ser carregado de consequências, esses bárbaros convertidos (ostrogodos, visigodos, burgúndios, vândalos e, mais tarde, lombardos) conerteram-se ao arianismo, uma forma de doutrina cristã julgada herética pelo Concílio de Nicéia.O que poderia ser um laço religioso foi, pelo contrário, um tema de discórdia e gerou ásperas lutas entre os Bárbaros arianos e os Romanos, Católicos.

=> (pág 48-49-50-51) O embrionário mundo medieval resulta do encontro e da fusão de dois mundos, de uma convergência das estruturas romanas e das estruturas bárbaras em transformação. O mundo romano, desde o século III estava a afastar-se de si mesmo. O comércio (a princípio, um comércio interno, entre províncias) estava em declínio. As cidades destruídas pela fúria bárbara, definhavam também sem a rede de abastecimento. Os citadinos abandonam-as pelas proximidades das esparsas zonas de produção. E assim, a fisionomia do Ocidente Medieval se esboçava, gradualmente: uma atomização em células viradas sobre si próprias e separadas umas das outras por “desertos” - florestas, gândaras e baldios. A ruralização é, ao mesmo tempo, e em primeiro lugar, um fato social que medeia a face da sociedade medieval. A desorganização de algumas trocas peseudocomerciais nas cidades arrasadas faz aumentar a fome, e a fome leva as massas para os campos e submete-as à servidão perante os dadores de pão, os grandes proprietários. A moeda de ouro deixou de circular e, quando é cunhada pelos soberanos merovíngios (francos), é mais por uma questão de prestígio, de vontade de exercício de uma prerrogativa soberana do que necessidade econômica.

=> (pág 52-53-55) A fuga a certos ofícios e a mobilidade da (volumosa) mão-de-obra rural tinham obrigado os imperadores do Baixo Império a declarar obrigatoriamente hereditárias determinadas profissões e tinham estimulado os grandes proprietários a vincular à terra os colonos destinados a substituir os escravos que rareavam. Era preciso conservar no seu lugar os homens necessários a uma economia que já não se alimentava com fornecimentos externos e ia cristalizando localmente.
E a Cristandade Ocidental formará o cimento necessário a este novo universo, transformando o desejo de fugir desta nova realidade estacionária num pecado capital. Tal Pai Tal Filho – esta será a lei da Idade Média Ocidental, herdada do Baixo Império Romano. O ideal estará numa sociedade de camponeses tenentes (de manere, ficar). Sociedade estratificada e compartamentada, horizontalmente.
Os invasores bárbaros vieram infiltrar-se à força nesses estratos sem grandes dificuldades. Afinal, repetindo, os invasores eram sedentários em fuga. Substituiram, à definição de Marc Bloch, o “nomadismo dos homens” pelo “nomadismo dos campos”, praticando uma agricultura seminômade, praticando a rotação dos afolhamentos, cultivando em queimadas e deslocando os seus cultivos temporários no interior de um determinado perímetro por desbravamentos marginais.
O apego do pequeno camponês bárbaro ao seu alódio¹, era, certamente, tanto maior quanto é fato que ele fazia questão de afirmar a sua independência – atitude normal por parte de um colono instalado num país conquistado e que pretende mostrar a sua superioridade sobre a massa indígena sujeita à servidão aos grandes proprietários (romanos pobres das cidades reduzidos à servidão de gleba). Segundo ainda Marc Bloch, “ a ação de uma civilização sobre outra não se mede, necessariamente, pela relação numérica dos elementos em presença”. Mas o desejo dos povos bárbaros – principalmente depois que se dividiram em pequenos grupos instalados no territótio romano - de não perder as tradições e os costumes a que estavam ligados foi singularmente reforçado pelo receio de ver-se numericamente abafados pelas antigas populações. Afinal, os Bárbaros, depois de sua instalação no Ocidente Romano, representavam 5% da população total.













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