sábado, 5 de janeiro de 2013

Fortaleza de Ormuz: presença portuguesa no Oriente

 
 Para que o projeto português no comércio das especiarias fosse bem sucedido, longe de concorrências locais e mesmo do embrionário expansionismo europeu além do Atlântico, houve a necessidade em se controlar o acesso às rotas aos portos das chamadas 'Índias'; utilizando-se de um expediente similar ao dos romanos na Antiguidade (que levou a transformar o Mediterrâneo no famoso "Mare Nostrum"), as naus portuguesas singraram os confins do oceano Índico levando padrões e tropas aos estreitos que ligavam o referido oceano ao restante do mundo. Assim, Portugal obteve o controle das alfândegas de Malaca (sudeste asiático), Macau (extremo sul chinês), Áden (no Bab-El-Mandeb, entre a Arábia e a Somália) e a mais famosa e poderosa de todas as passagens fortificadas - demonstração do gênio e da força lusa no século XVI -, a Fortaleza de Ormuz, na entrada do Golfo Pérsico, hoje uma das regiões mais vigiadas do globo por conta do trânsito dos petroleiros saídos da área que abastece dois terços do mercado global de combustíveis.
As informações abaixo visam apenas o interesse no assunto, não servindo para consulta acadêmica ou estudo mais aprofundado. Boa leitura!

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O Forte de Nossa Senhora da Conceição de Ormuz localiza-se na ilha de Gerun, no estreito de Ormuz, atual República Islâmica do Irão.
Ormuz (ou Hormuz) foi uma importante cidade marítima e um pequeno reino próximo à entrada do golfo Pérsico. O primitivo sítio da cidade era na margem norte do Golfo, a cerca de 30 milhas a leste da atual Bandar Abbas. Por volta de 1300, aparentemente em função de ataques Tártaros, foi transferida para a pequena ilha de Gerun, que pode ser identificada como a Organa de Nearcho, aproximadamente 12 milhas a oeste e a 5 milhas da costa.
                                    
Na seqüência da afirmação da presença portuguesa na Índia, compreendeu-se a importância do controle do comércio com a península Arábica. Impôs-se assim a conquista de Ormuz, por sua posição estratégica, dominando a entrada do golfo Pérsico. A outra rota passava por Áden, próximo ao Bab-el-Mandeb, por onde se acede o mar Vermelho.
Ormuz constituía-se em um dos mais importantes centros comerciais da região, em seu mercado sendo trocadas cavalos e pérolas, de tal como que viria a ser considerada porAfonso de Albuquerque como a "terceira chave" do Império Português na Ásia, juntamente com as praças-fortes de Goa e Malaca.

Albuquerque fez a primeira tentativa para controlá-la em 1507. À frente de uma pequena frota de sete navios com uma força de quinhentos homens, dirigiu-se a Ormuz, tendo no percurso conquistado as cidades de Curiate (Kuryat), Mascate e Corfacão (atual Khor Fakkan) e aceitado a submissão das cidades de Kalhat e Soar (Sohar).
A frota portuguesa ancorou diante da cidade; o seu governante estava preparado para um ataque, contando com um efetivo que ascendia a de 15 a 20 mil homens de armas. Sem se intimidar, Albuquerque intimou-o a prestar-lhe homenagem e a tornar-se vassalo do rei de Portugal. Recebeu uma resposta evasiva, numa clara tentativa de ganhar tempo nas negociações. Ao final de três dias de espera, a artilharia portuguesa entrou em ação, tendo destruído a frota de Ormuz. Vendo as suas forças destroçadas, o soberano de Ormuz solicitou uma trégua oferecendo a cidade aos portugueses. Desse modo, Albuquerque concluiu, em setembro de 1507, um tratado pelo qual o soberano de Ormuz deveria pagar um tributo anual ao rei de Portugal. Como fruto desse acordo, iniciou ainda uma fortificação, cuja pedra fundamental foi lançada em 24 de outubro desse mesmo ano, sob a invocação de Nossa Senhora da Vitória.
Os trabalhos terão ficado a cargo do mestre de pedraria Tomás Fernandes.[1]
Durante esses trabalhos registou-se o chamado "Motim dos Capitães", um episódio de insubordinação que culminou com a deserção de três capitães portugueses. Estes, com o apoio do soberano de Ormuz, deram combate às forças de Albuquerque no início de janeiro de 1508. Após alguns dias de batalha, Albuquerque e os seus viram-se forçados a retirar da cidade, abandonado o forte em construção.





Em março de 1515, Albuquerque retornou a Ormuz, à frente de uma frota de 27 navios, com um efetivo de 1.500 soldados portugueses e 700 malabares, determinado a reconquistá-la. Bem sucedido, ocupou a posição da antiga fortaleza em 1 de abril, retomando a sua construção, agora sob a invocação de Nossa Senhora da Conceição.
Nessa época, os principais portos do golfo Pérsico e da Arábia, tais como Julfar, Barém,Calaiate (Qalhat), Mascate, Catifa (al Qatif), Corfacão, e as ilhas de Queixome (Qeshm) eLareca, encontrava-se sob o domínio do reino de Ormuz. Com a sua queda, todas as cidades e portos da região tornaram-se tributárias do rei de Portugal: o reino de Ormuz permaneceu como uma potência regional, em articulação com o Estado Português da Índia. Sob esta fórmula, a presença portuguesa na região estendeu-se por mais de um século, até aos anos de 1620-1650.
Um documento coevo relaciona os portos que pagavam tributo a Portugal: Aigom e Docer "portos que estam na barra de terra firme", Brahemim "porto que esta de fora da ilha d'Oromuz na terra firme", Tezer "lugar na terra firme", Beabom, Borate, Jullfar (Julfar), Callayate (Qalhat), Horfacam (Khor Fakkan), Caçapo (Khasab), Broqete "na ilha Qeixa", Lafete "na ilha Qeixa", Qeixa "na ilha Qeixa", Garpez "na ilha Qeixa", Rodom, Costaque, Chagoa, Callecazei e Lebedia (in: Rendimento da cidade de Oromuz e seus reinos, 1515.)
Em 1521, o soberano de Ormuz rebelou-se contra o domínio português, mas foi derrotado e destronado, um novo governante aliado tendo ocupado o seu lugar.
Em 1523, D. Luís de Menezes ocupou Soar, que havia se revoltado e, após fazê-lo, prosseguiu para Queixome, onde um novo tratado foi celebrado com o novo governante, em virtude do qual uma feitoria portuguesa foi ali estabelecida.
Em 1526, o Vice-rei da Índia, Lopo Vaz de Sampaio (1526-1529), submeteu Mascate e Khalat que haviam se revoltado.
Em 1528 Cristóvão de Mendonça era Capitão-mor da Fortaleza de Ormuz.[2]
Em 1542-1543, a totalidade das receitas aduaneiras de Ormuz foi destinada ao rei de Portugal.
O período entre 1550 e 1560 foi de guerra contínua com os Turcos pela supremacia no Golfo Pérsico.
Em 1550-1551, os Portugueses conquistaram aos Turcos o Forte de El Katiff (Al Qatif) na Arábia. Em 1551-1552, os Turcos atacaram e saquearam Mascate. Com a sua retomada pelos portugueses e para complemento da defesa de Ormuz, foi iniciada a Fortaleza de Mascate.
Em 1559, os Turcos sitiaram os Portugueses no Forte de Barém, mas, após vários meses de cerco, foram forçados à retirada.
Data deste período, o final da década de 1550, a intervenção do arquiteto obidense Inofre de Carvalho na fortificação de Ormuz.




No contexto da Dinastia Filipina, as possessões portuguesas em todo o mundo tornaram-se alvo de ataques dos inimigos de Espanha, e no golfo Pérsico, particularmente dos Ingleses.
Neste período conturbado, os eventos sucederam-se rápidamente, até à perda das praças portuguesas e do controle da região.
Em 1581, Mascate foi uma vez mais arrasada pelos Turcos. No ano seguinte (1582), o soberano de Lara (a ilha de Larack, vizinha a Ormuz), que se revoltara, impôs cerco à Fortaleza de Ormuz. Os Portugueses, entretanto, conseguiram rechaçar os invasores e, a seu turno, impuseram cerco ao Forte de Xamel, em Lara, que conquistaram.
Finalmente, em 1588, a Fortaleza de Mascate estava reconstruída e a cidade fortificada, assim como havia sido erguida uma fortificação próximo a Matara (Matrah) – o Forte de Matara.
Por volta de 1591, com planos de Giovanni Battista Cairati, as defesas da fortaleza de Ormuz foram reforçadas.
O abastecimento de água potável de Ormuz era feito a partir dos poços em Comorão, na costa persa. Aqui os Portugueses mantiveram um forte (Forte de Comorão), que capitulou ante os persas em 22 de setembro de 1614.
Em 1616, Soar, que havia se revoltado uma vez mais, foi capturada por uma frota Portuguesa e o seu soberano, executado.
Em 1619, a fortaleza de Ormuz contava com um efetivo estimado entre quinhentos a setecentos soldados.
Em janeiro de 1619, Rui Freire de Andrada, "General do Mar de Ormuz e costa da Pérsia e Arábia", partiu de Lisboa para a região, com instruções para dispersar os Ingleses, que haviam fundado uma feitoria em Jâsk desde 1616, pressionando os Persas, em parte desalojando-os da guarnição em Qeshm e ali erguendo uma fortificação portuguesa. A armada fundeou em Ormuz a 20 de Junho de1620.
Em 1620 forças portuguesas sob o comando de Gaspar Pereira Leite erguem o Forte de Corfacão (atual Khor Fakkan).
Em 8 de maio de 1621, forças portuguesas sob o comando de Rui Freire de Andrada iniciam a construção do Forte de Queixome(Qeshm), para assegurar o suprimento de água potável para Ormuz. Este ato foi considerado como um sinal de hostilidade declarada pelo Xá da Pérsia, que, em 1622, com o apoio de forças árabes, consegue capturar Julfar aos Portugueses.
Na seqüência da queda do Forte de Queixome (11 de fevereiro de 1622), uma flotilha do Xá Abaz I da Pérsia, com mais de 3.000 homens e o apoio de seis embarcações Inglesas, colocaram cerco ao Forte de Ormuz (20 de fevereiro). Os Persas ofereceram ao comandante português da praça a ilha de Qeshm em troca de 500.000 patacas e o porto de Julfar, na costa da Arábia, recém-conquistado aos portugueses. A oferta, entretanto, foi recusada e, em poucos meses, Ormuz era perdida para os Persas e seus aliados Ingleses (3 de maio). A guarnição e a população portuguesa na ilha, cerca de 2.000 pessoas, foram enviadas para Mascate.
Ainda por uma década as forças Portuguesas, sob o comando de Rui Freire de Andrada, empreenderam diversas tentativas para reconquistar a fortaleza de Ormuz: militarmente em 1623, 1624, 1625 e 1627, e diplomáticamente em 1631, todas sem sucesso.
Com a queda de Ormuz, os Portugueses fixaram a sua nova base em Mascate, estabelecendo em 1623 uma feitoria em Basra, na foz do rio Eufrates. Nesse mesmo ano, Rui Freire de Andrada reocupou o Forte de Soar, perdido no ano anterior para os Persas e uma nova base de operações foi estabelecida em Cassapo (Kashab) na Península de Musandam.
Em 1624 o Forte de Quelba foi conquistada por Gaspar Leite; nesse mesmo ano, em maio, Mateus de Seabra conquistou o Forte de Madha. Em 1624-1625, na sequência da assinatura de um tratado com os Persas, uma feitoria e uma fortificação foram estabelecidas em Congo (Bandar Kong), na costa Persa do golfo Pérsico.
Finalmente, em 1631, os Portugueses ergueram o Forte de Julfar, importante ponto estratégico na península Musandan: durante o domínio português esta cidade conheceu um período de grande prosperidade, na qualidade de entreposto comercial regional.
O principal personagem deste período na região, Rui Freire de Andrada, faleceu em Setembro de 1633, sendo sepultado na Igreja de Santo Agostinho, em Mascate. Após a sua morte, no período que se estendeu até 1635, tratados de paz foram celebrados com os Persas e com os Ingleses.
De modo geral, considera-se que a presença Portuguesa no Golfo Pérsico ficou mais estável após a queda da fortaleza de Ormuz. De fato foram fundadas uma série de fortificações e feitorias como as de Soar, Julfar, Doba (Dibba Al-Hisn), Libédia, Mada (Madha),Corfacão (Khor Fakkan), Caçapo (Khasab), Congo (Bandar Kong) e Basra.
Em Agosto de 1648, os Árabes impuseram cerco a Mascate e, em 31 de outubro, um tratado foi celebrado entre Árabes e Portugueses: pelos seus termos, estes últimos deveriam arrasar as suas fortificações em Curiate, Doba e Matara.
Em Janeiro de 1650, Mascate, a última posição Portuguesa na Arábia foi conquistada pelos Omanitas. Com essa perda, Portugal ficava privado de sua última fortaleza na vizinhança do Golfo Pérsico e encerrava-se o chamado "Período Português" no Golfo.



 CONQUISTA DE MALACA, 1511.

Campanhas de Afonso de Albuquerque, Volume II

de Vítor Luís Gaspar Rodrigues e João Paulo Oliveira e Costa
Lisboa, Tribuna («Batalhas de Portugal», 33), 2012
120 págs.



  E caso se interessem por mais assuntos da história lusa, eis o link:

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

O Poder do Café e Vida Privada no Império - Brasil Império (P2)





Aqui, a primeira parte da matéria da P2 da Danny Crespo - falta pouco p'rá praia, moçada, vamos lá!


HISTÓRIA  DO  BRASIL  IMPÉRIO  -  P2

O PODER DO CAFÉ 
    A expansão cafeeira ensejou a opulência tão decantada pelos saudosistas do Império, mas que privilegiava apenas as elites, que habitavam o país ideal; o país real – o dos escravos, libertos e brancos pobres – não se beneficiara da pujança do café, produto ignorado até o início oitocentista mas que mudou (de todas as formas) a imagem do Brasil daquele período.
     Atribui-se a Francisco de Melo Palheta a introdução do café no Grão-Pará, em 1727, sementes vindas da Guiana Francesa; e, de fato, Belém já exportava o produto para Lisboa naquele século. Na sexta década do século XVIII surgem as primeiras notícias a respeito de seu cultivo nas cercanias do Rio de Janeiro, e a Tijuca seria, no início do século XIX, o local onde havia as maiores plantações, longe dos brejos e pântanos que haviam no centro carioca da época. A partir dali, o cultivo estendera-se para o Vale do Paraíba – que transformar-se-ia no maior produtor do Império durante quase todo o século XIX.
     A região era quase toda coberta por uma floresta virgem, com caminhos para tropas de muares rumo à região mineira no trecho ocidental, enquanto no oriental os indígenas dominavam a área. Alguns engenhos de açúcar, pousos para tropeiros que forneciam gêneros alimentícios para o Rio completavam a paisagem, pois os centros populacionais ativos estavam no litoral. A serra era praticamente abandonada.  A chegada da Família Real em 1808 deu um impulso enorme à lavoura cafeeira: Dom João beneficiou comerciantes e funcionários, concedendo-lhes enxurradas de sesmarias com o objetivo de ocupar as terras próximas à capital. Antigos mineradores também se estabeleceram às margens dos caminhos que ligavam o Rio às minas, além de gente ligada ao setor mercantil (alimentos e animais) que comercializava com a Corte. Progressivamente, o Vale transformara-se. Indivíduos investidos de títulos nobiliárquicos formaram grandes propriedades repletas de escravos e à medida em que as terras foram sendo ocupadas, um sem-número de indígenas foram dizimados com o aval da Coroa Portuguesa, pois era inadmissível, nos padrões europeus de cultura, a existência de seres humanos que não se preocupavam em acumular excedentes (isso, até hoje).
     Com a expansão cafeeira, os primeiros brancos, pequenos posseiros que viviam na região com suas lavouras de subsistência foram sendo expulsos da mesma forma que os indígenas, ou então se sujeitavam às ordens dos grandes proprietários, recebedores de sesmarias. Estas sesmarias só se concediam para quem dispusesse de trezentos a quatrocentos mil-réis, quantia bastante elevada para um pequeno fundiário. Logo após à posse, o novo (grande) proprietário tomava providências para despachar de suas terras os antigos posseiros contanto com as autoridades locais, que os consideravam elementos indolentes, preguiçosos.  Mas a verdade era outra: não era por causa da preguiça do caboclo a arbitrariedade dos poderosos, mas porque não era interessante para o governo apoiar um pequeno produtor que não veiculava sua produção para a exportação (quantidade); em geral, o pequeno posseiro tinha sua lavoura cafeeira e de subsistência para seu básico de sobrevida, não se inseria no sistema de plantation cafeeira.  A relação entre pequenos e grandes proprietários continuava tensa (pois os pequenos tinham o certificado de posse de suas terras e agarravam-se a ele para mantê-las) até que em 1850 o governo imperial baixou a Lei de Terras: rezava a Lei, que as terras que fossem compradas estariam garantidas DESDE QUE não fossem cultivadas como simples roçados, além de exigir o registro de propriedades irregulares e terminar com os mecanismos de distribuição de terras do Antigo Regime (posse ou doação). Abrira-se o caminho para a transformação das terras em mercadoria. Abrira-se o fim do pequeno produtor do Vale do Paraíba. Mas alguns desses pequenos posseiros ainda tiveram contato com suas herdades pelo sistema de compadrio – relações amistosas com os cafeicultores – virando cabos eleitorais em disputas políticas daqueles. Outros, dedicaram-se a produzir alimentos para as grandes propriedades e muitos foram mortos de forma violenta.


   VALE DO PARAÍBA   X   OESTE PAULISTA
A organização da cafeicultura fluminense prolongava a estrutura econômica herdada do período da colonização: a riqueza dos fazendeiros se media pelo número de pés de café e de cativos. Além de prestígio social que lhes assegurava, as peças de ébano ainda serviam para a obtenção de créditos e terra; afinal, numa fazenda cafeicultora, o item mais valioso no balanço imobilizado não era exatamente o café, mas o número de escravos da fazenda.
As técnicas rudimentares de cultivo (queimadas), o desinteresse em investir na melhoria das técnicas de produção, a abundância de terras virgens para o replantio quando do enfraquecimento e queda das colheitas iniciais, tudo isso contribuiu para que ocorresse a queda da cultura cafeicultora no Vale do Paraíba. O fim do tráfico negreiro em 1850, o gasto com artigos de luxo e compras de mais escravos (agora encarecidos pela queda da oferta estrangeira) levou o Vale do Paraíba à decadência e o Oeste Paulista à ascensão a partir de 1870, este com a gradual substituição da mão-de-obra escrava pela imigrante. O capitalismo em expansão carreou recursos para as regiões exportadoras de matérias-primas, investindo-se em setores de serviços e transportes (malha ferroviária até Santos), e em novas técnicas para o setor cafeeiro, que dispunha, inclusive, de um solo com uma terra vermelha de excelentes nutrientes, a terra roxa.  


A HEGEMONIA FLUMINENSE
No regime monárquico brasileiro (singularidade política no Novo Mundo), o Rio de Janeiro forjou-se com um padrão de comportamento que molda o país pelo século XIX e mais da metade do XX. No decurso dos oitocentos, dois quintos da população da província era de cativos, na cidade que se orgulhava de ser a única representante do ‘sistema europeu’ na América, retalhada por repúblicas. 110 mil dos 266 mil habitantes da urbe eram de escravos; por volta de 1840, quem chegasse no Rio sem saber, vindo de fora, acharia estar num porto ou cidade africana. Numa data em que o tráfico estava proibido há um ano, num censo realizado em 1849 mostrou um habitante em cada três do município havia nascido na África. 


SOTAQUE CARIOCA  E DIALETOS AFRICANOS
Nos anos 1870, metade da população masculina da Corte era estrangeira, vinda principalmente de Portugal. Ana Bittencourt, por volta de 1860, registrava que os baianos podiam distinguir a fala “bastante aportuguesada” do sotaque fluminense.  A imigração portuguesa que desembarcara no Rio dez anos antes colaborou para transformar a linguagem falada no Rio em linguagem mais apurada, escandida numa sintaxe e num vocabulário mais polido que apagava os regionalismos difundidos na imprensa provincial durante os debates políticos das revoluções regenciais. O português, misturados com línguas nativas, foi uma tônica no Norte e em algumas províncias ao sul, como São Paulo, cuja dificuldade em se exprimir nos fonemas inexistentes na língua tupi-guarani (rr, f e l, por exemplo), se mostra até hoje.
   

PAQUETES ENTRE O BRASIL E A EUROPA (marcação do tempo nos relógios)
Horas e minutos da regularidade diurna nos trópicos, cuja medida costumava ser aleatória e desnecessária aos luso-brasileiros, começavam a ser marcados passo a passo, de cebolão na mão, nas casas, fazendas, estradas, rios, portos do litoral. Com a inauguração de uma linha regular de navio a vapor (‘packets’, aportuguesado para paquetes, 28 dias exatos de viagem) entre o Rio de Janeiro e Liverpool, na Inglaterra,  o tempo imperial entra em sincronia com a modernidade européia. Chovesse ou fizesse sol, a linha mantinha o ritmo de seus vapores com uma pontualidade naturalmente britânica.  


CHEGADA DE PRODUTOS EUROPEUS MUDA O HÁBITO DA POPULAÇÃO
Pianos, fogões, instrumentos musicais: a sociedade tropical escravagista aos poucos incorporava hábitos e utensílios usados no Velho Mundo, com o ‘boom’ da Segunda Revolução Industrial e as rotas dos paquetes extremamente regulares; pouco se dá se, na proporção de 5 por 1, os produtos europeus (quase inteiramente industrializados) abarrotam os mercados de subsistência brasileiros ao passo que, na Europa, quando muito, sacas de café e gêneros primários aportam em poucas praças européias. Máquinas de costura, pianos, patins para gelo, burras de ferro, debulhadores de milho, mobílias; o piano tornou-se o feitiche da época, objeto de desejo dos lares patriarcais, um móvel aristocrático que inaugurava um novo cômodo nas casas oitocentistas: o salão, um espaço privado de sociabilidade que torna visível para os observadores selecionados,  a representação da perfeita vida familiar.


O 15 DE NOVEMBRO E A PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA
Embora presente em alguns movimentos até anteriores à Independência, o republicanismo não criou raízes no Brasil até quase o final do século XIX; na realidade, nesses casos, o ideal republicano tendia muito mais a se constituir um meio para questionar o poder de Lisboa ou do Rio de Janeiro em nome duma proposta federalista que assegurasse maior autonomia para as províncias. Mesmo a Regência (1831-1840) fora tido em conta duma experiência republicana para alguns autores. Mas o temor à anarquia devido ás reivindicações de descentralização levou à opção pela ordem com a Maioridade de Dom Pedro II. 


A Guerra do Paraguai pode ser considerado o estopim do questionamento quanto aos rumos que a sociedade e a política brasileira tomava naquela segunda metade oitocentista; o Exército obteve duras porém significativas vitórias no conflito, e compunha seus quadros uma tropa formada por escravos libertos, escravos substitutos de senhores arredios, brancos e mestiços pobres, oficiais acabrunhados pela impressão que os sul-americanos faziam de sua sociedade escravagista e pela indiferença da arma em relação à Guarda Nacional – composta de componentes sem especialização militar básica – como força de defesa do país. A oficialidade, ao retornar da guerra, viu-se imbuída de participar dos destinos políticos da nação.

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Grécia Antiga - resumo para a P2




O Período Homérico e parte do Período Arcaico. dando tempo, postarei o restante - vamos que vamos, moçada!


HISTÓRIA   ANTIGA  -   Resumo para a P2

GRÉCIA ANTIGA:
O conjunto de traços que se articularam para compor o que chamamos de Grécia Clássica desenvolvera-se a partir  do século X a.C, aproximadamente (Época Homérica, 1100 – 700) . A formação da ‘pólis’ grega data do Período Arcaico (700 – 500, aproximadamente). O Período Clássico corresponderia ao século V e parte do IV (499 – 350) e o declínio, a partir do restante do século IV (340 – 146), sob a Era Helenística.
Podemos admitir que a Ilíada e a Odisséia remetem-nos a três períodos históricos específicos: A Idade do Bronze, dos palácios micênicos; o mundo estabelecido após a chegada dos dórios na Grécia; a época de Homero (séc. VIII a.C).
ÉPOCA HOMÉRICA:
O mundo que se seguiu à destruição de Micenas é também conhecido pelo nome de “Idade das Trevas”; uma civilização florescente ser substituída por um período de declínio acentuado do nível de vida, seguido por uma reestruturação sócio-econômica, onde os alicerces da futura Grécia Clássica foram inicialmente assentados. Os dois poemas  supracitados de Homero fornece-nos uma informações importantes sobre a economia e a sociedade.
Oikos, seria traduzido como casa, família. Em Homero, seu significado se amplia: seria uma unidade econômica, humana, de consumo e produção. Um chefe guerreiro e sua família, escravos e servidores, bens imóveis, terra, casas, ferramentas, armas, gado,etc. O trabalho produtivo dum oikos era realizado por escravos, obtidos geralmente em atividades de pilhagem e saque. Outro modo de obter os escravos era através de compra. Mesmo com os escravos realizando tarefas produtivas, nada impedia que o chefe de um oikos participasse dessas atividades; Aristóteles diria mais tarde que “[...] o que faz a condição de um homem livre é que ele não vive sob o constrangimento de outrem[...]”.
Todas as atividades domésticas , desde banquetes até a tecelagem, eram supervisionadas pelas senhoras da casa. O tratamento aos escravos era diferenciado para alguns, dependendo de sua fidelidade ou boa vontade no cumprimento das tarefas. A condição do escravo num oikos era muito melhor que a de muitos livres pobres, relatados na Odisséia. O caso do escravo Eumeu é significativo nesse ponto. Abaixo dos escravos em condição social, está o teta: homem sem posses ou especialização alguma, solto no mundo, não contava com a proteção de ninguém. Outra categoria entre os homens livres é o demiurgo, traduzido aqui como sendo indivíduos com alguma especialização ou habilidade manual, artesãos itinerantes que, por ocasião de alguma necessidade que fuja às capacidades do oikos, o chefe do mesmo manda-os vir. Sua destreza numa atividade confere-lhes uma posição mais privilegiada entre os homens livres.
    Apesar da importância destes ‘technoi’, o grego daquela época nutria um sentimento  de desprezo por aquele trabalhador e pelo trabalho: a figura do grande proprietário de todo oikos, que detinha o poder político, fazia parte de uma aristocracia fechada cujos membros se identificavam graças a uma mesma posição social e econômica, reforçando sua união por laços de parentesco, fidelidade e amizade – esta era a figura de proa da sociedade Greco-homérica, e o sentimento de desprezo pelos demiurgos encontra eco no panteão olímpico que veneravam: Hefaísto ou Hefestos, o Artesão Divino, que forjava as mais belas armas e baixelas para os deuses era, ao mesmo tempo, um ser horrendo , deformado; por ser artesão, jamais poderia igualar-se em beleza e perfeição aos outros deuses.
     Segundo Homero, esta aristocracia reunia-se em Assembléias e deliberava sobre os destinos da comunidade; dentre eles, um era nomeado rei. Sua nomeação derivava de sua habilidade guerreira e sabedoria além da riqueza material. Nas Assembléias deliberativas, o “povo” participava também, mas apenas para encorpar a reunião, sem poder de decisão ou sequer deliberação sobre quaisquer questões. Mesmo antes do nascimento da ‘pólis’, nota-se uma relativa tensão entre o poder individual do rei e o poder da aristocracia. Parece existir de igual forma um conflito entre o oikos econômico e o resto da comunidade.  
    A autarquia econômica dos oikos pressupõe um ideal caro à civilização grega: cada oikos procurava bastar-se a si próprio em tudo o que fosse necessário, embora dois produtos indispensáveis vinham de fora: metais e escravos. E como o comércio era uma atividade mal vista, relegada a segundo plano na sociedade grega, próprio para bárbaros, somente em casos extremos é que os gregos trocavam objetos necessários, mas estritamente equivalentes, de modo que nenhuma das partes sairia lesada na transação. O que faltava (metais e escravos, além de tecidos finos) em sua sociedade era obtido através de pilhagens, saques e dos sistemas de dom e contra-dom.

PERÍODO ARCAICO:
Bem mais documentada e com apontamentos mais fiéis sobre problemas pessoais, sentimentos ante situações concretas, esse período contém uma boa gama de informações de tal sorte que, mesmo nenhum documento escrito em prosa, lei, texto cotidiano ou decreto, podemos obter mais apontamentos da poesia do período arcaico do que dos poemas homéricos: Hesíodo (séc.VIII a.C), Alfeu, Safo, Arquíloco, Teognis, Sólon (Sécs. VIII – VII a.C).
     A mais importante criação do Período Arcaico foi, sem dúvida, a pólis, uma comunidade autônoma politicamente, auto-suficiente no plano econômico. Para que a polis existisse, do ponto de vista material, deveria ter um lugar central para reuniões  dos cidadãos, edifícios religiosos e públicos – a ágora. Uma acrópole (cidade alta) era necessária, como medida defensiva. Afora esses dois itens,  cada cidade-estado (polis) desenvolvia-se de um modo diferente, tinha dimensões diversas, etc.
    As causas do desenvolvimento de pequenas comunidades isoladas e politicamente autônomas tem sido explicada, muitas vezes, pela geografia: a Grécia é toda dividida por montanhas e pequenos vales, de difícil comunicação entre as comunidades. Para o historiador Finley,  “A tenacidade das pequenas comunidades independentes só pode ser explicada como um hábito resultante de uma profunda e enraizada convicção a respeito de como resolver o ‘viver junto’ (Ancient Greeks, pg 33). E é no Período Arcaico que os traços da cidade-estado vão se consolidando e se define o estatuto do cidadão, a prática da comunidade igualitária e, portanto, da democracia.
     A medida que o cidadão vai se liberando do exercício direto das atividades econômicas (essencialmente o trabalho no campo) para se dedicar às tarefas políticas, vai sendo substituído pelo escravo como força de trabalho. Como ressalta Austin: “Passa-se do domínio do pré-direito ao do direito”. Essa transição foi repleta de crises (stáseis); o poder da aristocracia residia na posse de terras, das melhores, inclusive. Hesíodo reflete uma tensão entre a aristocracia governante e a noção de comunidade que brota aos poucos.  Os grandes proprietários tendiam a aumentar ainda mais a quantidade de terras, expandir suas posses; num país pobre de terras como a Grécia, o pequeno proprietário não conseguia suprir seus sustento e o de sua família e, por isso, recorria a empréstimos (não em dinheiro,mas  geralmente em espécie)ao mais rico. Chamado de hectomoro, o devedor tinha que entregar um sexto de sua colheita e, no caso de insolvência, o indivíduo entregava-se ao credor de modo a ser escravizado ou ser vendido como tal. Ao morrer, suas terras eram repartidas igualmente entre os filhos, tornando os lotes, além de exíguos e pobres, insuficientes para o sustento de uma família. Resumindo: não havia terras para todos, o solo não produzia suficiente alimento para todos e as boas terras estavam nas mãos de poucos, que usufruíam do poder político.
     Uma das saídas para essa crise foi a colonização (sécs. VIII – VII a.C): com recursos fornecidos pelo Estado, grupos de colonos deixavam suas cidades e partiam em direção a oeste: Itália do Sul e Sicília. Ali, fundavam novas póleis e tentavam reconstruir o seu mundo como na Grécia, à procura de terras novas, onde pudessem plantar o que lhes faltavam.

     A apoikia era o tipo mais freqüente de colônia:  colônias autárquicas, eram cidades independentes que mantinham ainda laços religiosos e de aliança com suas metrópoles; estabeleciam-se numa localidade para morar e conseguir o seu sustento. O emporion era um tipo de coônia comercial, que estabelecia contato com regiões que pudessem fornecer mercadorias indispensáveis para os gregos como, por exemplo, metal. Esta era nitidamente um entreposto comercial.
      Outra saída para a crise foi a importação maciça de trigo: para facilitar essa importação, muitas colônias  foram fundadas no Mar Negro, através das quais tiveram acesso aos ricos campos da Criméia. 

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Colonização francesa na América, Encomienda e Mita (P2)





COLONIZAÇÃO FRANCESA NA AMÉRICA
O processo de colonização francesa da América iniciou-se no século XVI, no contexto das grandes navegações e da descoberta de novos territórios e rotas marítimas pelos europeus.
Seguindo-se a onda  colonialista  inaugurada   por espanhóis e portugueses, os franceses,ingleses e holandeses buscaram se instalar em regiões nas quais os primeiros colonizadores ainda não se estivessem estabelecidos, causando muitos conflitos e guerras entre os países colonizadores.
Os franceses conseguiram se fixar na América do Norte, nas regiões do Rio São Lourenço e dos Grandes Lagos. A partir de 1603, formaram as colônias de Terra Nova, Nova Escócia (Acádia) e Nova França (Canadá). Em 1608 foi fundada Québec e em 1643 Montreal. Em 1682 surgiu a cidade de Nova Orleans, localizada no vale no Rio Mississippi no Estado da Louisiana.
Assumiram o controle de algumas ilhas do Caribe (Hispaniola (República Dominicana e Haiti),Guadalupe, Martinica, Santa Lucia e Tobago) e de uma parte da América do Sul, que ficou conhecido como Guiana Francesa. As colônias comerciavam açúcar, peixe e frutas.
Para manter o controle das colônias, a Coroa francesa utilizou-se de autoridades locais. O povoamento foi pequeno, e as colônias acabaram servindo apenas como postos comerciais e estratégicos.
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A participação francesa na corrida colonialista nas Américas teve inicio em 1555, no Brasil, com a ocupação de um pequeno trecho do litoral fluminense, no qual foi estabelecida a França Antártica. A colônia serviu de refúgio para os calvinistas franceses, que estabeleceram boas relações com os nativos. Registro deixado por Jean de Lery, que esteve no Rio de Janeiro em 1557, informa que, se não fosse a preciosa ajuda dos tupinambás, os franceses não conseguiriam carregar um navio de porte médio com toras de pau-brasil em menos de um ano.
Mas os franceses e os tupinambás acabaram vencidos pelos portugueses e seus aliados indígenas. Uma investida francesa em terras maranhenses, em 1612-1615, também foi derrotada.
A ocupação efetiva de parte da América pela França só ocorreu no século XVII, nos moldes de um projeto mercantilista. Na América Latina, foram ocupadas partes das Guianas e das Antilhas – algumas dessas áreas até hoje fazem parte dos territórios franceses ultramarinos. Nas duas regiões, a colonização foi incentivada com o cultivo da cana-de-açúcar e do aproveitamento de plantas nativas, como a mandioca e o tabaco. A produção dos gêneros tropicais favoreceu o desenvolvimento de uma economia de plantation, com o uso de mão-de-obra escrava.
Na América do norte, o ponto de partida foi a fixação francesa no Quebec (Canadá), no início do século XVII. Na década de 1680, os franceses também ocupavam os vastos territórios da Louisiana, junto ao Golfo do México. Ali foi fundada, trinta anos depois, junto ao Mississipi, a cidade de Nova Orleans, até hoje a “metrópole francesa” dos Estados Unidos. Entre o Canadá francês e a Louisiana estendiam-se as pradarias do centro do continente, percorridas por caçadores e mercadores de peles franceses.
Mas a presença francesa era tênue. Como a metrópole se recusava a assumir as despesas da colonização, o projeto foi impulsionado pela iniciativa privada, por meio de companhias de comercio. Em muitas áreas, os franceses se dedicaram à caça, à pesca e à extração de madeiras, atividades nômades ou seminômades, que favoreciam a dispersão dos colonos. Em resumo, a França não empreendeu uma colonização efetiva como aconteceu na América inglesa, por iniciativa dos próprios cidadãos que migravam para o Novo Mundo.
A América francesa recebeu um serio golpe com a Guerra dos Sete Anos (1756-1763), travada entre duas coalisões europeias lideradas respectivamente pela França e pela Inglaterra. Em 1759, os britânicos conquistaram o Quebec. Em 1763, com o fim do conflito, as duas nações assinaram o Tratado de Paris, que determinou a entrega do Canadá e de parte das Antilhas francesas à Coroa inglesa. O tratado ainda estabeleceu que a região a leste do Rio Mississipi passaria a fazer parte do império colonial inglês e que a Louisiana seria entregue a coroa espanhola, que havia perdido a Flórida para os ingleses. Em 1800, a Louisiana foi devolvida à França, que a vendeu aos Estados Unidos três anos depois.

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     Mita,termo hispanizado, uma vez que o vocábulo não possui origem espanhola, mas sim Quíchua - Mit'a, era uma forma de trabalho compulsório herdada dos Incas pelos Espanhóis (à época colonial) no qual se baseava principalmente na exploração da mão de obra Indígena. Nesse sentido, os Índios eram deslocados de suas respectivas comunidades (geralmente por um prazo de 4 meses ou 6) e enviados a regiões onde ocorreria a extração de minérios, em especial a prata e ao mercúrio. A prática desse ato trouxe inúmeras consequências negativas para à saúde daqueles que eram sorteados ao trabalho compulsório e, além disso, acelerou de sobremodo a desestruturação de inúmeras comunidades indígenas.
Seguindo de perto o que Peter Bakewell expõe no seu texto sobre a América Espanhola, percebemos o predomínio da exploração da mão de obra indígena na mineração, ou seja, “a mineração apoiava-se no trabalho indígena.” De um modo geral, pode-se dizer que, entre os variados tipos de trabalho criados e/ou modificados pelos espanhóis, quatro “ modelos” são proeminentes, a saber::Encomienda , a Escravidão, o recrutamento forçado e os contratos contra salários. Nesse sentido, é fundamental ressaltar que à medida que os espanhóis conquistavam novos territórios tanto a encomienda quanto a escravidão tornavam-se comuns na América Central e Sul. E, não menos importante, está a questão de diversos povos nativos resistirem aos ataques espanhóis, o que consequentemente ocasionavam elevados números de mortandade indígenas.
Por volta do ano de 1570, sob o nome de Repartimiento (do espanhol partición) na Nova Espanha (seria o que hoje se entende como
México) e Mita (em quíchua: rodízio) no Peru, ocorrera uma espécie de reformulação nas formas de recrutamento que até então eram utilizadas. Neste cenário, a Coroa Espanhola se beneficiou de sobremaneira pelo fato que conseguira a um só tempo implementar na América uma força de trabalho nativa assalariada – fato que não existia até então – e ainda reduzir a participação dos encomenderos no trato com os indígenas; isso significa dizer que neste último caso, o poder de influência que os encomenderos detinham sobre determinadas regiões nativas aos poucos iam se perdendo, o que, de certa forma, aumentava o poder da Coroa nos seus intentos nas Américas. Don Francisco De Toledo , que assumira o posto de vice rei Peruano no ano de 1569, fora um dos principais mentores daquilo que é considerado como um “modelo” de recrutamento visando a mineração nas Américas Espanholas. Conhecida como a Mita de Potosí, ela desprendeu de mais da metade das 30 províncias daquela área, homens entre 18 a 50 anos que estivessem aptos ao trabalho deveriam ser deslocados para Potosí todos os anos. “Segundo o Censo realizado por Toledo, isso proporcionaria mão de obra suficiente para Potosí: cerca de 13 500 homens por ano.” Fato curioso: Toledo era conhecido por ter uma personalidade extremamente arraigada a conceitos morais cristãos da reforma protestante.
Dentre as implicações negativas para a população indígena, a mita subjugou-os a um excesso de trabalho e, por conseguinte acabou tornando-os suscetíveis a uma gama variadas de doenças, mormente doenças relacionadas a respiração. Os "Mitayos", termo utilizado para aqueles que trabalhavam nas minas, eram obrigados a deslocamentos extensos e, durante o trajeto, não era raro que alguns não resistissem e, portanto, morressem no caminho; Quando da chegada aos locais de trabalho, por geralmente trabalharem nas minas, é de se depreender as condições insalubres nas quais estavam sendo impostos, ou seja, ausência de luz, pouca ventilação, esparsas condições de locomoção dentro dos veios etc. Basicamente, existiam dois tipos de divisão da mão de obra nas minas: "os barreteros", que se utilizavam de barras e picaretas e, em certo sentido, eram mais especializados e angariavam melhores salários; e os "carregadores" que por serem destituídos de conhecimentos técnicos eram empregados no carregamentos daquilo que era encontrado nas prospecções.

A encomienda, originalmente aplicada na região das Antilhas em 1503, com posterior projeção em outras porções da América espanhola, constando nos registros legislativos coloniais até o século XVIII, foi uma instituição jurídica imposta pela coroa com vistas a regular o recolhimento de tributos e circunscrever a exploração do trabalho indígena. Estabelecida a partir de um arranjo contratual, caracteriza-se pela submissão de um número variável de indígenas “pagadores de impostos” a um encomendero, – inicialmente os mais notáveis soldados espanhóis nas guerras de conquista – responsável por viabilizar sua incorporação aos moldes culturais, econômicos e sociais europeus. No âmbito da circunscrição territorial, a encomienda não é uma concessão de terras, mas uma concessão de recolhimento de tributos. Diferentemente do que ocorre com a escravidão, não é perpétua nem transmitida hereditariamente, já que os nativos, ao menos juridicamente, foram tomados não por propriedade, mas por homens livres, embora seja possível uma aproximação entre ambas, dado que são expressões da forma de trabalho compulsório.
 As origens institucionais da encomienda remontam, ainda, ao século V d.C., quando, diante da reconfiguração territorial do Império Romano, por meio da commendatio, ou patrociniun, o senhor oferecia proteção militar e apropriava-se de forma extra-econômica dos produtos resultantes do trabalho servil.